A obesidade é uma doença que, segundo dados de 2019 do Instituto Nacional de Estatística, acomete 17,4% das mulheres e 16,4% dos homens em Portugal. Define-se com um Índice de Massa corporal (IMC: calcula-se através da fórmula: peso (kg)/altura (m)2) superior ou igual a 30 Kg/m2 segundo a Organização Mundial da Saúde.
Várias mulheres e homens terão pré-obesidade (25 = IMC < 30) e obesidade no período fértil, o que poderá ser uma causa de infertilidade ou, então, de problemas futuros até para o recém-nascido. A obesidade está relacionada com a infertilidade uma vez que se associa a problemas como a anovulação, distúrbios menstruais, aborto espontâneo e resultados adversos da gravidez.
A obesidade no período pré-conceção
O planeamento de uma gravidez, principalmente em mulheres com pré-obesidade e obesidade, e a intervenção ao nível da modificação de estilos de vida, com perda de peso e atividade física (se sem contraindicações) poderá levar a uma melhoria na conceção.
Segundo as guidelines de um grupo de trabalho multiprofissional convocado pelo National Collaborating Centre for Women’s and Children’s Health, as mulheres com IMC superior a 29Kg/m2 devem ser informadas que levarão mais tempo para atingirem a conceção. Se permanecerem nestas condições e ainda não estiverem a ovular devem ser informadas de que perder peso aumentará a probabilidade de conceção. No que diz respeito aos homens, estes também devem ser alertados de que é provável que padeçam de fertilidade reduzida em IMC superiores a esse valor.
Quando são necessários tratamentos de procriação medicamente assistida (técnicas de tratamento de situações de infertilidade conjugal com apoio laboratorial) para o atingimento de uma gravidez, as mulheres devem ser informadas que o IMC deve estar idealmente no intervalo entre 19-30 Kg/m2 previamente aos tratamentos, uma vez que valores fora deste intervalo podem reduzir o sucesso dos procedimentos.
O ganho de peso gestacional adequado
No período da gravidez o aumento do peso é algo natural, e tal acontece devido a vários fatores como a formação da placenta, líquido amniótico, crescimento do bebé, entre outros. Perante isso, e para equilibrar os benefícios do crescimento saudável do bebé e as mínimas complicações para a mãe no parto e pós-parto, estão preconizadas recomendações para um ganho de peso adequado na gravidez de acordo com o IMC pré-gestacional da mulher.
O Institute of Medicine (IOM) apresenta, para cada IMC pré-gestacional da mulher, um intervalo de ganho de peso adequado, sendo que para mulheres obesas o ganho de peso recomendado será sempre inferior ao ganho de peso recomendado para mulheres com peso normal (tabela 1). Vários estudos evidenciam que ganhos de peso gestacionais fora dos intervalos preconizados pelo IOM, quer sejam ganhos de peso inferiores ou superiores aos recomendados, podem trazer malefícios para o bebé e para a mãe.
IMC pré-gestacional | Intervalo de ganho de peso recomendado (Kg) |
Baixo peso (<18,5 Kg/m2) | 12,5 – 18 |
Peso normal (18,5 – 24,9 Kg/m2) | 11,5 – 16 |
Pré-obesidade (25,0 – 29,9 Kg/m2) | 7 – 11,5 |
Obesidade (=30,0 Kg/m2) | 5 – 9 |
Tabela 1 - Recomendações do IOM relativas ao ganho de peso gestacional
Obesidade pré-gestacional e saúde do recém-nascido
É do conhecimento geral que a obesidade pode levar ao desenvolvimento de várias co morbilidades como a diabetes, a hipertensão arterial, entre outras. Mas quando falamos de obesidade em grávidas temos de pensar que essa obesidade não afetará apenas a saúde da mulher, mas também a saúde do seu futuro filho a curto e, possivelmente, a longo prazo. Aliás, essa grávida pode já estar a interferir na saúde do seu futuro(a) neto(a).
Na grávida, a obesidade pode levar ao desenvolvimento de diabetes gestacional e pré-eclâmpsia (ou doença hipertensiva da gravidez que se caracteriza, resumidamente, por pressão arterial elevada e pode acarretar sérias complicações se não tratada) conduzindo a uma maior probabilidade de ocorrência do parto por cesariana.
No que concerne ao recém-nascido, há maior probabilidade de ele nascer macrossómico (com mais de 4kg de peso corporal) e grande para a idade gestacional, segundo os percentis que se usam para aferir o peso do recém-nascido para a idade gestacional, e um menor Índice de Apgar ao 1.º e 5.º minutos (teste que indica o grau de adaptação do bebé à vida extrauterina), o que nos faz concluir que a obesidade da mãe afeta de imediato a saúde do recém-nascido logo no momento do nascimento.
Ganho de peso gestacional e saúde do recém-nascido
Já falamos sobre o ganho de peso adequado durante o período de gravidez. Mas, o que acontece se o ganho de peso gestacional for superior ao recomendado? Tal como na obesidade pré-gestacional, no parto pode haver maior probabilidade de ocorrência de cesariana em detrimento do parto normal e o recém-nascido pode nascer com mais peso, macrossómico e grande para a idade gestacional.
Ora, esta maior probabilidade de o bebé nascer com peso elevado, macrossómico e grande para a idade gestacional pode ter repercussões a longo prazo, pois esse bebé, na infância e na idade adulta, terá maior probabilidade de ser obeso, com todos os problemas que isso acarreta.
O papel do nutricionista na problemática do peso materno e da fertilidade
Apostar na prevenção é sempre o passo primordial, algo que neste país é muito negligenciado. Assim, sempre que possível, deve planear-se a gravidez de forma a se conseguir otimizar o peso da mulher; a atividade física; o consumo alimentar; a suplementação vitamínica e mineral, a segurança alimentar (na manipulação dos alimentos e nas possíveis toxi-infeções), a possível eliminação do consumo de substâncias prejudiciais como o álcool, o tabaco, entre outras e a promoção da fertilidade. Inclusive, as mulheres em idade fértil que pretendam engravidar devem ser aconselhadas sobre todos os riscos associados à obesidade na gravidez de forma a perceberem que, de facto, a manutenção de um peso saudável será sempre mais benéfica para a conceção e para a futura gravidez. Assim, o nutricionista pode ajudar neste objetivo de peso, aperfeiçoando a alimentação e a fertilidade, uma vez que já existe evidência da relação da alimentação com a fertilidade. Aliás, já começam a ser definidos pressupostos alimentares de uma “dieta da fertilidade”.
Esta dieta está associada à diminuição da infertilidade, devido a problemas de ovulação, e consiste no seguinte:
- aumento do consumo de gorduras insaturadas (como o azeite, peixe gordo), em detrimento das gorduras trans (encontram-se em alimentos processados como manteiga, bolachas);
- preferência de fontes de proteína vegetal (como leguminosas) em vez de animal;
- preferência de hidratos de carbono de baixo índice glicémico (não aumentam rapidamente a glicose (açúcar) no sangue);
- necessidade de suplementação.
Também no que concerne a gestações provenientes de técnicas de procriação medicamente assistida, a adesão a um padrão alimentar mediterrâneo parece estar associada a uma maior taxa de sucesso de gravidez após procedimentos de procriação medicamente assistida (como a fertilização in vitro e injeção intracitoplasmática de espermatozóide). Este padrão alimentar consiste numa alimentação mais rica em cereais integrais, hortofrutícolas, peixe e gorduras insaturadas, azeite e alimentos baixos em gordura.
O nosso tipo de dieta, dieta ocidental, comporta um alto consumo de fast food e baixo consumo de frutas e hortícolas, estando associada à necessidade de um maior período de tempo para atingir a conceção. Assim, e em jeito de conclusão, o que parece mesmo interessante à luz da evidência científica e que promove a saúde em geral e a fertilidade em particular, é a adesão a padrões alimentares saudáveis que incluam cereais integrais, peixe, frutas, hortícolas e azeite.