A espasticidade muscular resulta de uma lesão no sistema nervoso central e cursa com o aumento de um reflexo num músculo ou grupo(s) muscular(es) por perda do controlo central que é feito pelo cérebro.
Este aumento do tónus ou hipertonia é involuntário e por definição depende da velocidade do movimento aplicado durante a avaliação do segmento do corpo envolvido. Acompanha-se por hiperreflexia e o doente pode referir espasmos.
Os músculos perdem a capacidade de relaxar e estão constantemente contraídos. Possui uma fisiopatologia e um significado diferente da rigidez que resultada da imobilidade e não depende da velocidade utilizada na avaliação dos músculos afetados.
A espasticidade altera o equilíbrio entre os músculos agonistas e antagonistas, prejudica os movimentos e interfere com a atividade que o doente pretende desenvolver como por exemplo vestir-se, tomar banho, alimentar-se, escrever, realizar as transferências ou deambular.
No entanto, a espasticidade pode ser benéfica e útil se o doente a utilizar por exemplo para pendurar e transportar um saco na mão semi-fechada ou ainda para assumir a posição de pé quando a espasticidade se localiza nos membros inferiores.
A espasticidade pode manifestar-se de forma precoce nos primeiros meses após a lesão neurológica ou mais tardiamente só após vários meses.
A intervenção terapêutica é precedida da avaliação e do estabelecimento de objetivos para o tratamento. Os objetivos são personalizados e envolvem a definição de metas realistas que devem ser atingidas no período de tempo estabelecido. São definidos com os doentes, familiares e/ou cuidadores e a equipa de reabilitação.
Gravidade da espasticidade
O grau de espasticidade é frequentemente avaliado pela escala de Ashworth modificada e classificado em 5 grupos de gravidade crescente, conforme descrevemos de seguida.
- 0 - Sem alteração do tônus muscular;
- 1 - Discreto aumento do tônus muscular com resistência mínima nos últimos graus do movimento;
- 1+ - Aumento do tônus muscular em menos de metade da amplitude do movimento; as partes afetadas são mobilizadas com facilidade;
- 2 - Aumento do tónus em mais de metade do arco do movimento; as partes afetadas são mobilizadas com facilidade;
- 3 - Acentuado aumento do tônus muscular. Embora com grande dificuldade é possível completar as amplitudes articulares no movimento passivo;
- 4 - O segmento afetado é rígido,em flexão ou em extensão
Causas da espasticidade
As lesões do sistema nervoso central como as lesões do cérebro ou as lesões da medula espinhal podem ser a causa da espasticidade. No entanto, nem todos os doentes desenvolvem espasticidade ou as complicações associadas a esta entidade. São
causas frequentes de espasticidade a paralisia cerebral, o acidente vascular cerebral (AVC), o traumatismo craneo-encefálico, a lesão medular, a esclerose múltipla e a esclerose lateral amiotrófica.
Os doentes com paralisia do nervo facial podem desenvolver uma reinervação anómala responsável por aumento da atividade motora, contração muscular, sinquinésias e assimetria da face, com um quadro clínico idêntico aos dos doentes com espasticidade.
Sintomas da espasticidade
A espasticidade pode ser focal, regional ou generalizada.
Os principais sintomas relacionam-se com a presença de movimentos involuntários como os espasmos, reações associadas indesejáveis e pela incapacidade para utilizar os músculos espásticos e realizar os movimentos pretendidos. Os músculos espásticos apresentam-se contraídos, com menor capacidade para relaxar e para produzir força. Por estes motivos pode surgir incapacidade para levantar o braço, esticar o cotovelo e abrir a mão e podem ocorrer quedas frequentes durante a marcha ou dores fortes nos movimentos realizados pelo próprio ou pelos cuidadores.
A espasticidade associa-se a maior dificuldade na realização dos movimentos, traduz-se em aumento da fadiga nas atividades diárias incluindo a deambulação e pode prejudicar o posicionamento do doente como por exemplo na permanência no leito ou na cadeira de rodas.
Os principais sinais clínicos são o aumento do tónus, a presença de clónus, aumento dos reflexos osteotendinosos, diminuição das amplitudes articulares, alteração do posicionamento dos membros superiores e inferiores e alteração do padrão de marcha.
São complicações frequentes da espasticidade mais grave a dor, a deformidade articular, a luxação ou sub-luxação da anca, o encurtamento musculo-tendinoso e ligamentar e as úlceras de pressão ou escaras.
Diagnóstico da espasticidade
O diagnóstico da espasticidade é clínico baseado na anamnese e no conhecimento da etiologia, nomeadamente no conhecimento da patologia neurológica envolvida. Apoia-se no exame físico que incluir a mobilização passiva e ativa do segmento afetado e a avaliação funcional com análise dos posicionamentos, transferências, movimentos seletivos e da marcha.
A análise cinemática da marcha e a baropodografia permitem uma importante avaliação e reavaliação qualitativa e quantitativa antes e após o tratamento.
A espasticidade tem cura?
A espasticidade tem bom prognóstico quando diagnosticada e tratada precocemente evitando desta forma as suas graves complicações.
Saiba, de seguida, como tratar a espasticidade.
Tratamento da espasticidade
A espasticidade pode ser controlada recorrendo a tratamentos de fisioterapia, terapia ocupacional e utilização de ortóteses de posicionamento também conhecidas como talas, bem como de calçado adaptado quando indicado. Devem ainda ser corrigidos os fatores agravantes como os estímulos nociceptivos, os posicionamentos incorretos e o sedentarismo.
Quando pelos meios acima referidos ou se a espasticidade for mais acentuada e não estiver controlada o doente pode ser medicado com medicamentos (ou remédios) anti-espásticos como o baclofeno e a tizanidina. O baclofeno pode ser administrado por via oral ou se a espasticidade for acentuada e resistente à terapêutica oral por via intratecal, com implantação de uma bomba infusora.
A administração intra-muscular electiva de toxina Botulínica é a terapêutica de eleição em doentes com espasticidade focal ou regional em que os músculos a tratar e a posologia são selecionados após avaliação do doente e identificação dos objetivos do tratamento.
A toxina Botulínica tem ainda um efeito benéfico no alívio da dor pela diminuição da libertação dos neurotransmissores da dor na fenda sináptica. A toxina Botulínica é aplicada localmente na placa neuromotora por injeção no músculo responsável pela espasticidade e possui um efeito transitório. O efeito da medicação sobre o local da aplicação pode ter uma duração de pelo menos 6 meses, com um tempo de efeito ótimo entre 3 a 4 meses, podendo ser necessário repetir posteriormente a aplicação por perda da eficácia. O intervalo entre as administrações deve ser respeitado e não inferior a 2 meses de forma a minimizar o risco de desenvolvimento de anticorpos que anulariam a eficácia deste medicamento em aplicações posteriores.
A intervenção que inclua exercícios e atividades dirigidas aos objetivos pré-definidos potencia os bons resultados do tratamento farmacológico com melhoria da qualidade do movimento e consequentemente da qualidade de vida do doente.